"Quando um filho perde um pai, ele fica órfão. Quando um pai perde um filho, não existe palavra".
Nem palavras.
A série documental da Netflix "Ninho: Futebol e Tragédia" (direção do craque Pedro Asbeg) consegue valer a mínima máxima de que "mil imagens valem...". Valem por milhares de documentos e documentários. Centenas de assinaturas de responsáveis que não assumem. Assinaram sem ler. Ou nem assumem, nem assinam.
Apenas somem como os principais cartolas nessas horas eternas como a melhor escalação da história do clube: Christian, Bernardo Pisetta, Arthur Vicente, Athila, Rykelmo, Jorge Eduardo, Pablo Henrique, Samuel, Vítor Isaías e Gedson. A que o torcedor do clube entoa em todos os jogos. Também por enojado por alguns de seus próceres improcedentes e/ou impudentes.
O timaço de 10 com dois goleiros pra sempre de um clube que naquele mesmo 2019 teve o melhor futebol do século na América. E que em 1981 escalou o melhor time que vi na vida. Com 8 dos 11 titulares formados na Gávea.
Como estavam sendo formados no Ninho do Urubu aqueles 10 meninos sub-16 com a melhor escalação dos sonhos desfeitos por gambiarras assumidas em um container-dormitório que não estava na proposta aprovada na prefeitura. Desde maio de 2018 era irregular e com "grave risco". Tanto que gerara 31 multas ao clube. Dez delas pagas. As 21 não pagas por um preço que não tem valor.
Poucas vezes vi série tão bem editada e pesquisada. E que me tenha deixado tão impactado. Com o cuidado e sensibilidade que falta à muita gente irresponsável no caso que não é acaso. É descaso. Caso de polícia.
Os depoimentos são cortantes.
"Eu peguei um menino em casa em uma família e devolvi num caixão", diz o agente de um dos garotos de 14 a 16 anos que partiram em 8 de fevereiro de 2019.
O doc não responde a tudo. Mas não se levanta e deixa sem respostas como um dos representantes da associação.
"[A ausência do presidente do clube numa reunião com as famílias dos 10 meninos] foi mais triste que o enterro do meu filho", disse uma das mães.
"Onde achei que meu filho estava mais seguro foi onde eu o perdi".
"Um time que tem tanta importância pra mim e pra minha família foi o time que tirou o meu filho de mim" diz a mãe da única família que não aceitou ("acertou") as contas com o clube.
Algo que sei por ter vivenciado caso semelhante. E por conversar com meus colegas da turma de Direito na USP: algumas famílias aceitam acordos que nunca serão os ideais para não terem que ficar por longo tempo botando sobre a mesa um preço na vida e na morte do filho.
Na celebração de um ano da tragédia, só os pais de Pablo entraram no CT. Os demais foram barrados porque não "solicitaram entrada prévia"...
A série apresenta muitas coisas que não sabia. Algumas inimagináveis. E outras que não surpreendem por quem conhece minimamente os indigitados e suas digitais.
Pergunta uma das mães durante a CPI na Alerj: "um clube tão grande não tem um presidente para falar? Manda sempre um vice [para falar com as famílias e com as autoridades]?
É tudo mesmo sobre valores.
Sobretudo os que não têm preço.
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